É notória, a grande
variedade de ritmos e sons que fazem parte deste vasto território. Hoje
nós presenciamos uma certa decadência da música brasileira em geral, porém existem muitos que honram o nosso país e continuam a
fazer som de alta qualidade. Mas, o que aconteceu com o gosto musical da
grande massa? Onde estão aquelas pessoas que cantavam suas músicas
preferidas com o fervor que se canta um hino militar num momento de
guerra, nos tão famosos Festivais de Música Popular Brasileira,
ocorridos entre 1965 até 1985, onde cada um escolhia suas músicas e
artistas preferidos, onde cada letra tinha um significado tão intenso
que cada um se identificava de maneira diferente com cada música?
Precisar o momento em que o gosto
popular “baixou o nível” não é possível. O povo deixou de gostar do
popular e passou a engolir o popularesco, e o que é pior, tentando
acreditar que isso se encontra no mesmo “patamar” que a tão famosa, tão
diversificada e tão bela Música Popular Brasileira está.
Então, esqueçamos tudo o que se produz
hoje em dia, e olhemos para o passado, lembremos de um movimento musical
chamado Bossa Nova.
É interessante notar que o Brasil,
sempre que passa por momentos marcantes na sua “vida”, sempre tem a uma
trilha sonora que marca cada época. E assim, como músico que tento ser,
procuro sempre conhecer um pouco da história, e sou fascinado pelo poder
que a música tinha, e até hoje tem, de intensificar emoções, desejos e
movimentos sociais no seio do povo.
Seguindo nosso roteiro, a Bossa surge nos anos 30, com Noel Rosa, em plena ditadura Vargas, onde o povo vivia uma quebra de paradigmas, e seu maior marco foi a Semana de Arte Moderna de 1922, movimento este que perpetuou, e rompeu com vários pensamentos elitistas brasileiros. A Bossa nova engatinhava, e com o decorrer do movimento modernista, ganha cada vez mais força e chega à década de 50 com poder total e com grandes expoentes da música brasileira: Tom Jobim, Vinicius de Moraes e o PAI da Bossa, João Gilberto. Não vou me aprofundar mais, mas a profundidade de cada letra, a beleza, a simplicidade, das harmonias complexas, é de arrepiar. O Brasil vivia uma grande época, que perdurou por muito tempo.
Outro grande momento da música brasileira foi o movimento tropicalista, que chega de uma maneira mais agressiva, mais gritada, mais presente, mais intensa que a bossa, surge na década de 60, mas se firma nos anos 70. A censura, que reinava sob as ordens dos militares que comandavam a ditadura, caiu em cima. Caetano, Gil, Tom Zé, Rogério Duprat (o maestro da Tropicália), Mutantes, revigoram e reinventam a música brasileira mais uma vez usando a astúcia e criatividade que burla uma dura censura. Com músicas experimentais, um momento crucial para a definição da Tropicália foi o Festival de Música Popular Brasileira, no qual Caetano Veloso interpretou “Alegria, Alegria” e Gilberto Gil, ao lado dos Mutantes, “Domingo no Parque”.
No ano seguinte, o festival foi integralmente considerado tropicalista (Tom Zé apresentou a canção “São Paulo”). No mesmo ano foi lançado o disco Tropicália ou Panis et circensis, considerado quase como um manifesto do grupo. Um movimento que aproximou São Paulo e Bahia. Tão revolucionário que não queira nem entender essa capa do disco Todos os Olhos, do Tom Zé.
A Jovem guarda de 60, que vem até antes da própria tropicália, vem mostrando todo um movimento que acontecia fora das fronteiras brasileiras. Os olhos se voltavam para o velho continente, o Rock explodia na Europa com: Beatles, Stones, Beach Boys, The Who. Foi uma coisa bombástica, que chegou ao Brasil preservando as melodias, mas com letras adaptadas para o português, e não só isso, Roberto Carlos comandava junto com Erasmo Carlos uma série de composições que revelavam também o espírito rebelde dos jovens brasileiros, só lembrando que todos estes movimentos musicais não obedecem a ciclos onde um começa quando acaba o outro, é lógico que eles são contemporâneos, o que gerou, entre integrantes da Bossa e da Jovem Guarda, uma relação não tão amistosa.
“[...] As relações entre a jovem guarda e a bossa nova nem sempre foram cordiais. Havia quem, como Jorge Ben, transitasse entre os dois programas: o Jovem Guarda e o Fino da Bossa. Mas Elis, que apresentava o Fino com Jair Rodrigues, chegou a liderar uma passeata contra as guitarras elétricas. [...]” Silvio Essinger.
Nos anos 80 o Brasil também encontra um
movimento importante, também impulsionado por um momento político
importante, a queda da ditadura, o fim da opressão, o fim da censura, o
fim das mãos atadas, dos pensamentos proibidos, mais uma vez o Rock
volta com tudo! Paralamas do Sucesso, Ultraje a Rigor, Barão Vermelho,
Legião Urbana (que consolida a carreira nos anos 90), vieram com tudo e
os jovens puderam explodir no primeiro Rock In Rio em 1985, um evento de
grande porte, que nunca tinha acontecido no Brasil. Além de grandes
nomes da música brasileira, uma galera de fora veio fazer um som aqui,
mas o mais importante foi a música brasileira mais uma vez presente,
junto com os outros nomes citados, estavam também, Pepeu Gomes vindo da
tropicália, Moraes Moreira e Baby.
Que fique bem claro que não estou aqui ditando o que é bom e o que é ruim, porém aquele velho e batido ditado “gosto não se discute”, não funciona, pois gosto se discute SIM! Gosto não se impõe, por isso estamos falando de bons momentos da música brasileira, este nada mais é que um texto saudosista sendo seu autor um cara que anda triste com a atual cena musical brasileira, onde os bons de verdade vivem à margem do gosto do grande público.
Quando falo música boa, não estou
dizendo que determinado estilo é melhor que outro, afinal, tratamos aqui
de vários ritmos, estilos e comportamentos diferentes, sempre
explorando o lado bom, diferente da música popularesca de hoje em dia
que de bom não enxergo nada: letras, harmonias, influências e intenções
totalmente medíocres.
Então, pra não dizer que trata-se de um desabafo fruto de um saudosismo exacerbado, vamos ouvir música popular brasileira atual de excelente qualidade vocal, instrumental, melódica, ritmica e poética.
Então, pra não dizer que trata-se de um desabafo fruto de um saudosismo exacerbado, vamos ouvir música popular brasileira atual de excelente qualidade vocal, instrumental, melódica, ritmica e poética.
11 comentários:
Infelizmente o povo abraçou de fato e de verdade o "popularesco"...vamos fazer o que, né? um povo que ainda não é atendido por completo no que tange a educação...o que vemos é isso mesmo! é uma pena!
Realmente, é contrastante e inexplicável a incrível qualidade da música brasileira (presente sempre para quem a buscar) e o mau gosto insaciável da maior parte do público consumidor, que, ao mesmo tempo, tem o poder de formar essa desqualificação toda.
A verdade é que há consumo para esse (na sua grande maioria, infelizmente) lixo musical.
Talvez sejamos poucos, não somos saudosistas, temos é bom gosto e acredito que com um pouco de insistência conseguiremos melhorar o padrão cerebral da massa.
Por enquanto a capa do LP do Tom Zé - Todos os Olhos, define.
Parabéns, Marlon!
Flor, bom te ver por aqui colaborando com teu comentário muito pertinente, por sinal. Mas quando você diz: Fazer o que, né? A impressão que fica é que realmente não há nada por ser feito para que essa geração, seja de consumidores e fãs desse estilo popularesco, ou de suas vítimas, consigam, tomara num futuro não muito distante, desvencilhar-se dessa cultura musical forjada, sem qualidade harmônica, ritmica e poética. Não creio que a música brasileira esteja se transformando nisso como se fosse parte de um processo de renovação e evolução musical. Vejo, sim, como uma jogada midiática e da indústria fonográfica que captam, leem o imaginário do público, apropriam-se dele e produzem esse formato de música com o qual seus consumidores passam a associar fatos de seus cotidianos e, consequentemente, vai compor uma espécie de trilha sonora de boa parte de suas vidas. O problema reside no fato de que esse público passa a ser refém, de certa forma, voluntário, de toda essa jogada comercial por não mais deter o poder de escolha daquilo que se ouve. Como dizer que preferem esse ou aquele gênero musical e não apreciam outros, quando, na verdade, não conhecem os últimos?
Obrigado, Renata! Adorei teu comentário, assim como, gosto muito de tuas postagens que poderiam ser mais frequentes, né? A questão é: O que querem com tudo isso? Onde querem chegar? Sempre que esgota-se uma ou outra forma de opressão, manipulação, outras tomam seu lugar. O gosto musical das massas reflete ou é reflexo, com muita fidelidade, de uma série de outras coisas correlacionadas. É claro, o nível de interesse e de envolvimento com todas as manifestações de caráter cultural, artístico, acadêmico, político, etc. é compatível com o nível das músicas que estouram nas paradas de emissoras de rádio e televisão de um modo geral. Mas, é gratificante perceber que ainda há muita gente combatendo toda essa onda de mesmice e pobreza musical, não necessariamente movidos pelo saudosismo, mas por buscarem, até com sofreguidão e incessantemente, outros ares, outras expressões e possibilidades musicais e, em muitos casos, recorrem ao passado para experimentar e conhecer outras propostas melhores elaboradas em todos os aspectos. Entre esse público mais exigente há um exército de jovens, ainda bem.
O problema da música brasileira são os ouvintes, são os únicos responsáveis por aceitar o que jogam na nossa cabeça. E não, não vejo uma solução a médio ou curto prazo (talvez nem a longo), é como a educação, o preconceito, a intolerância... se for analisar a fundo, conseguirá identificar quanto misoginismo e intolerância existem nessas músicas que fazem "a cabeça" da maioria do popular.
Se o Brasil fosse habitado por seres "pensantes" e cientes de seu lugar no mundo, com certeza haveria uma nova geração revolucionária na música, assim como foi a bossa nova, a tropicália e outros mais.
Daniela, que bom que você apareceu por aqui - e não vai sair mais - trazendo sua opinião sempre forte e inteligente, 'para nossa alegria'...rs
Não economize a sua veia polêmica, ok? Concordo com você; apenas gostaria de fazer uma ressalva em relação à responsabilidade pelo momento de decadência por que passa a produção musical nas duas últimas décadas. Os ouvintes tem sim, muita culpa por aceitarem qualquer coisa que o mercado joga em suas cabeças, como você mesmo diz; mas, como evitar? Para onde fugir? Lembrando que estamos tratando de uma visão e concepção de música verificada em um nicho que consideramos 'senso comum'. Nós sabemos como evitar, para onde fugir, onde e como encontrar outras propostas musicais, mas, infelizmente, não são todos que tem esse privilégio de conscientização em relação à música. Quem consome a misoginia, a intolerância, o preconceito, a vulgarização e despoetização do amor e a banalização dos bons sentimentos contidos nas letras das canções? E não que sejam mensagens subliminares, pelo contrário, são muito explícitas até...
Então, o que torna boa parte dessa geração musical atual e seus consumidores tão diferente da geração Bossa Nova e da tropícália?
São questões que podemos discutir mais. Vale a pena estarmos buscando respostas possíveis e, de uma forma ou de outra, insistirmos no resgate e divulagação da música de qualidade, enquanto podemos encontrar. Seja bem vinda, Daniela!
Olá, Daniela
Seja bem vinda ao nosso "cantinho virtual"! É gostoso ver pessoas inteligentes como você por aqui, isso nos gratifica e nos motiva ainda mais. Concordo contigo: a mídia e os interesses das gravadoras (além de outros interesses escusos) são muito massacrados, mas a culpa maior do atual nível da nossa música é dos ouvintes, uma massa acrítica e sem refinamento artístico, sem aquela "sintonia fina" que faz distinguir o bom do ruim. Esse povo está cada vez mais acostumado e deseja a mediocridade, quando não o lixo mesmo, então é isso que os músicos, as gravadoras e a mídia lhes oferece. Como eu disse para um leitor em uma outra postagem, essa ignorância musical reflete também, além da crise da educação, a vulgaridade e descompromisso com a arte que tomaram conta de uma sociedade excessivamente permissiva, um trenzinho da alegria onde a ordem é "pegar geral", "ficar" nas baladas com o máximo de pessoas possível, tudo e todos são descartáveis, provisórios, sem afeto, sem vínculos. O que pode querer ouvir alguém assim? Lirismo, delicadeza poética e temas relevantes? Náááá... O negócio é "vamos fazer tchu tchu tcha tcha" - e dê-lhe grana para os oportunistas do mau gosto geral! E se não se vislumbra uma solução imediata ou a médio prazo para essa avacalhação toda, conforta um pouco saber que existe uma boa parcela do povo que resiste, que não se rende aos apelos e à cara-de-pau cada vez maior dos "artistas" e da mídia, que ouve música alternativa de diversos estilos, épocas e lugares.
Consola também saber que não precisamos ter vergonha da imagem da música brasileira no exterior; afinal, se o Michel Teló, com meia dúzia de palavras mal escritas, fez esse sucesso estrondoso no mundo inteiro, se o Paulo Coelho foi condecorado até na França, significa que a crise de mau gosto e decadência é geral.
Um beijo
Lilly
Ja disse isso antes e repito aqui, a preguiça tomou conta da musicalidade. Isso acontece aqui na Inglaterra tambem, mas no Brasil a coisa e bem pior. Tenho mais perguntas que respostas. Os jovens no Brasil pensa que nao se tem mais nada pra lutar??? todas a guerras ja foram ganhadas e agora e so aproveitar os frutos musicais de algumas decadas de arvores musicais que secaram???
Quem aguenta ver o Caetano cantando uma nova versao de leaozinho no cd novo??
Musica boa e de qualidade se tem em todos os lugares, e so procurar que vc acha, nao estou muito por dentro da musica brasileira ultimamente e por muitas razoes, Titas agora sao quase que sertanejos, e Frejat? nao aprendeu nada com o Cazuza?????
Eu poderia encher paginas e paginas da Lero musical com muita gente de cacife e musica interessante pra durar a vida inteira mas eu acho que os leitores que vem a esta pagina ja sabem o que e bom e usa a internet de uma maneira mais saudavel. Quanto aos outros eles tem que parar de assistir tv, esquecer que existe novela na globo e procurar uma coisa mais saudavel pra ler e ouvir.
Beijos mil.
Verdade, Carlinho, você diz muito sobre isso em sua postagem "Preguiça musical globalizada". A única produção musical que segue em rítmo alucinante é a que tem uma finalidade meramente comercial. Mesmo porque essa forma de música não exige quase nenhum conhecimento prévio sobre o assunto, por incrível que pareça é isso mesmo. Compor com inspiração? Não, isso não nos pertence mais. Saber cantar? escrever? Enfim, a impressão que se tem é a de que esgotou-se o espaço de beleza para criação musical, do 'novo' com qualidade melódica, poética, instrumental, vocal! Mas seguimos acreditando que tudo isso talvez não passe de um momento ruim da música atual que, patrocinada pela mídia e indústria fonográfica, visa apenas dinheiro e fama.
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